Capítulo 5 – Além da Casa Destruída – 2ª Parte

 

Já era muito tarde para voltar à casa e procurar por Lucas. Por esse motivo não nos arriscamos a entrar na mata novamente, mas devo confessar que estávamos todos amedrontados com a história que a Aline contou. Não sabíamos o que fazer, e resolvemos procurar nossos pais e contar o ocorrido. É claro que os pais de Lucas ficaram desesperados quando souberam do ocorrido, e partiram em direção à mata a fim de encontrar Lucas nem que tivessem que ir o mais fundo possível. Receberam a ajuda de várias pessoas da nossa comunidade, inclusive muitos pais da gente ajudaram, e passaram aquela noite nos arredores do parque e da casa. Mas nenhum se aventurou a ir muito longe, já que estava bem escuro. Nem a lua cheia que fazia seria suficiente pra iluminar uma mata densa. E assim seguiu-se noite adentro.

 

No dia seguinte nós crianças saímos para procurá-lo também, mas fomos reprimidos por nossos pais que não permitiriam o risco de mais de nós se perder. A polícia ajudava na procura, e todos nós fomos obrigados a relatar a eles o ocorrido, pra ajudar nas buscas. A respeita do relato da Aline, acho que nem preciso dizer que não acreditaram muito na história dela. Os mais velhos achavam que o que ela tinha visto era fruto do seu desespero naquele momento. Mas nós acreditávamos na história dela, talvez por sermos crianças, ou talvez por alguma espécie de sensação, que de vez em quando tínhamos lá, de que alguma coisa havia dentro daquela mata. Na verdade, algumas outras pessoas acreditavam nela também, inclusive alguns pais, que passaram a nos proibir de ir pra lá depois desse ocorrido.

 

Então nos reunimos na casa de um amigo, e ficamos por lá, esperando notícias positivas. Um pouco mais tarde, chegou a Aline, e pode conversar mais calmamente com a gente, mas ainda notava-se uma enorme angustia na sua voz. Disse que depois de tanto contar a mesma história, e ninguém acreditar nela, tinha desistido, e de agora em diante apenas iria dizer que tinham se perdido um do outro devido ao desespero de estarem perdidos. Disse também que tinha tido pesadelos durante a noite, onde ela estaria num descampado sendo caçada por pessoas malvadas, e ao longe, ela avistava a casa destruída, com pessoas ao redor e na parte de dentro dela. Mas era impossível ver direito essas pessoas, o máximo que se conseguia era ver as suas silhuetas, e muitas nem pareciam de fato humanas. Esse não foi o único pesadelo que ela nos contou a respeito. Nos meses que se seguiram ela vivia atormentada por esses sonhos bizarros, mas com o passar do tempo parece que ela começou a superar isso.

 

Começamos então a conversar sobre aquela estranha mata que se estendi além da casa destruída. Cada um de nós contou histórias que já tinham ouvido falar sobre aquele local. Na verdade todos nós já conhecíamos essas histórias de cor e salteado. Essas histórias eram umas espécies de lendas, que são comuns relatos em todas as partes do Brasil, mas sempre na sua cidade se diz que isto acontece em algum lugar próximo. Foi dito, por exemplo, sobre um demônio que habitava aquela mata, e que aparecia para aterrorizar as pessoas que se aventuravam a ir pra dentro dela. Segundo diziam, esse demônio primeiro atraia as pessoas alterando as trilhas. Depois começava a imitar vozes humanas, para enganar as pessoas perdidas, de que estavam perto da civilização, e quando estes percebiam, já estavam totalmente dentro da mata, e não conseguiam nunca mais voltar de lá.

 

Havia uma outra história sobre uma criatura, uma espécie de cavalo negro, com olhos vermelhos, ardendo em chamas. Esse cavalo passava as noites galopando pela mata, com seus olhos flamejantes riscando o ar a medida que ele corria velozmente, soltando seu relinchar que fazia gelar a espinha de qualquer um que ouvisse. Outros relatos, ou lendas, que foram contadas por nós falavam de estranhas aparições vistas por pessoas que passavam perto desse parque à noite. Falava-se de motoristas que passavam por lado de pessoas, e quando olhavam no retrovisor, não havia ninguém. Alguns até afirmavam já ter dado carona para essas pessoas. Também eram comum histórias sobre luzes que eram vistas dentro da mata, assim como outros tipos de criaturas bizarras muito comuns do folclore brasileiro, como o Saci, a Mula Sem Cabeça e o Curupira.

 

O telefone tocou. O que fez com que todos nós déssemos um salto de susto. Finalmente, depois de horas de angústia haviam encontrado Lucas. Fomos que nem loucos para encontrá-lo. Dá para se imaginar qual foi a nossa alegria ao reencontrá-lo, especialmente da Aline, que chorava sem parar. Segundo os policias e equipes de busca, tinham-no encontrado a cerca de 1.500 metros após a casa destruída. Próximo a um casebre que parecia não pertencer a ninguém a anos, apesar de ainda estar bem conservado. Lucas contou que tinha conseguido com dificuldade avistar aquele casebre, e tinha passado a noite lá, para, ao amanhecer, tentar desesperadamente encontrar o caminho de volta.

 

Quando informado do relato da Aline, Lucas apenas disse que não tinha encontrado pessoa alguma, e muito menos escutado alguma espécie de cântico, ou visto algo estranho. Eu conhecia Lucas muito bem, e sabia que naquele momento ele estava mentindo.

 

 Escrito por Felipe Duccini